domingo, 9 de dezembro de 2007

Contestação da CML - Turma 3

Exmo. Sr. Juíz do

Tribunal Administrativo e Fiscal de

Lisboa

2º Juízo – 1ª Unidade Orgânica

Proc.º n.º 45665/07

Acção Administrativa Especial

para impugnação de acto administrativo

Vem a Câmara Municipal de Lisboa, pessoa colectiva de direito público, sita na Praça do Município, n.º 2, representada pela Sociedade Abecasis, Morais, Paes de Almeida e Associados, de acordo com o art.11º n.º 2 CPTA (conforme procuração apensada em anexo), apresentar a Contestação à pretensão formulada por António Lisboa no processo acima identificado,

Dos Factos

O pedido formulado na petição inicial do presente processo deve ser julgado improcedente

O que está em causa é saber se é ou não legítimo o pedido de anulação do acto de licenciamento n.º 040956/78 do empreendimento comercial, referido no artigo 1º da p.i.

O vale de Alcântara é uma zona que apresenta uma ocupação industrial e comercial obsoleta, carecido de uma estrutura urbana coerente e funcional

O Plano Director Municipal, adiante designado PDM, tem por base a estratégia do desenvolvimento local, estabelece a estrutura espacial, a classificação básica do solo, assim como parâmetros de ocupação, considerando a implantação de equipamentos sociais, e desenvolve a qualificação dos solos urbano e rural.

No âmbito do PDM, Alcântara é considerada uma zona de intervenção prioritária, tendo como grandes objectivos a sua reconversão e requalificação

O PDM deve ser visto como uma realidade dinâmica, que necessita de constantes adaptações às situações práticas que o desenvolvimento económico-social exige. Não deve ser visto como um instrumento insusceptível de alterações e que tenha de permanecer imutável no tempo.

De acordo com as exigências estabelecidas no Regulamento do PDM de Lisboa (DR 1ª Série B, nº 226, de 29 de Setembro de 1994), foi apresentado um Estudo Urbanístico daquela zona de Alcântara, por uma equipa coordenada pelo Arqt.º John Smith III e acompanhada pela CML, estudo este aprovado em reunião da Câmara de 30 de Maio de 2007, publicitada no Boletim Municipal n.º 642 (junto em anexo)

Irá ser elaborado, pelo Departamento de Inserção Social da Câmara Municipal de Lisboa em cooperação com a entidade que vai gerir o centro comercial, um programa de apoio e integração dos habitantes da Quinta do Cabrinha, permitindo assim, ao mesmo tempo que se criam novos postos de emprego, uma progressiva inserção dos habitantes daquele bairro social.

Relativamente ao facto descrito no ponto 3º da p.i., verifica-se, de facto, que a cércea ou altura do edifício, ultrapassa os 25 metros previstos no art. 65º, n.º 1, al. e) do Regulamento do PDM. No entanto, a altura do centro comercial atinge os 29 metros devido à instalação de painéis solares (painéis estes que têm uma altura de 4,5 metros) no telhado do edifício. Assim, parece-nos deveras desproporcional, a impugnação do acto com fundamento na violação da cércea máxima, ainda mais, quando esta viola o referido artigo devido à utilização dos referidos painéis solares.

Estes painéis solares serão instalados na parte de cima do edifício e irão proporcionar uma capacidade média de armazenamento diário de energia na ordem dos 3000 kW

Quanto à violação do PDM relativa aos Sistemas de Vistas, conforme o Estudo urbanístico (junto em anexo), a referida violação não existe, ao contrário do que o autor vem alegar.

10º

O Autor vem alegar no ponto 5º da p.i. a violação do direito ao Ambiente e à qualidade de vida, consagrados no art. 66º, al. b) e c) da CRP. Ora, não nos parece que este “direito”, que apesar de se dever considerar como um verdadeiro direito fundamental, possa vir justificar a anulação de uma licença relativa a uma obra que trará o já referido interesse para a população daquela zona. Tratam-se isso sim, de um direito fundamental que deve ser vistos numa perspectiva de interesses da comunidade no seu todo, e que não pode servir para justificar pretensões individualizáveis por parte de um único morador de um edifício próximo.

11º

O Autor alega a violação do disposto no art. 18º, nº1 da Lei de Bases do Ambiente (Lei n.º 11/87 de 7 de Abril). Não nos parece que o projecto em apreço se enquadre no âmbito desta disposição. O preceito do art. 18º, n.º1, carece de concretização, trata-se de conceitos indeterminados que têm de ser aplicados pelo intérprete in casu.

Não nos parece que o projecto, quer seja pela sua silhueta, cor ou localização provoque um impacte violento na paisagem existente. O centro comercial foi projectado pelo arquitecto John Smith III, arquitecto internacionalmente reconhecido, tem uma arquitectura bastante moderna que não irá provocar o designado “impacte violento”. Houve um prévio enquadramento paisagístico do projecto, realizado não só por arquitectos, assim como por conceituados designers internacionais que asseguraram que o edifício não iria ser mais uma obra que em nada está relacionada com o espaço que o circunda, tendo como é óbvio em conta o facto de estar localizado na Frente Ribeirinha da cidade de Lisboa

12º

Relativamente ao referido pelo Autor no ponto 7º da p.i., não nos parece que se possa falar de uma tutela da confiança relativa à manutenção do espaço paisagístico do imóvel, aquando do momento da aquisição do mesmo. Não há nenhuma disposição, que formalmente consagre esta tutela e não nos parece que a mesma se possa retirar de qualquer princípio jurídico existente no nosso ordenamento. Os habitantes de uma determinada zona têm de estar cientes da evolução económico-social, cada vez mais rápida nos dias que correm, e não podem esperar que o espaço que circunda as suas habitações se mantenha imutável ao longo do tempo, apenas porque confiaram numa suposta expectativa no momento da aquisição do imóvel.

Do Direito

13º

A Câmara Municipal de Lisboa tem legitimidade passiva enquanto órgão emissor da licença, verificando-se assim os critérios enunciados no art. 10º, n.º2

14º

O acto administrativo de licenciamento da obra comercial deve ser considerado válido

15º

O Autor vem alegar a violação do art. 68º, al. a) do DL 555/99, sendo a referida violação do PDM relativa aos arts. 55, n.º 1, al. e) e 23, n.º4 do Regulamento do mesmo, conforme ponto 12º da p.i.

16º

De facto, formalmente, verifica-se a violação da cércea máxima e do Sistema de Vistas imposto pelo Regulamento do PDM.

No entanto, a necessária ponderação entre o interesse público e os interesses privados que eventualmente se encontrem em conflito, levam-nos a concluir o seguinte,

17º

A Administração Pública está vinculada à prossecução do interesse público, de acordo com o princípio enunciado no art. 266º CRP.

O projecto “Acima de Nós Só a Ponte sobre o Tejo”, revela um manifesto e relevante interesse público.

Os grandes objectivos do referido projecto são a requalificação urbana duma zona industrial que se mostra em degradação profunda e contínua; pretende-se a criação de uma rede de espaços públicos coesa integrando equipamentos, zonas verdes, assim como o centro comercial, único na zona, que irá atrair e criar novos postos emprego, com o consequente desenvolvimento local através da instalação de pequenas e médias empresas.

18º

Ora, é inegável a dinamização que este projecto poderá trazer a zona de Alcântara; pretende-se com a concretização da obra a introdução de equipamentos colectivos, comércio, serviço e actividades económicas com base tecnológica podendo, inclusive, viabilizar a criação de novas estruturas académicas, bem como de investigação. O sector económico também será favorecido visto a possibilidade de criação de infra-estruturas e instituições de apoio ao desenvolvimento de novas actividades empresariais.

19º

No campo da Acção Social, este projecto também pretende ter um impacto profundo. A freguesia de Alcântara e dos Prazeres tem zonas de potencial risco, nomeadamente na área que circunda a Quinta do Cabrinha e o antigo Casal Ventoso. A população desta zona das freguesias é carenciada e que tem de ser progressivamente integrada na sociedade, e esta integração, que se revela de enorme interesse público, deve começar por partir das entidades públicas.

20º

A Câmara Municipal de Lisboa tem em agenda a assinatura de um protocolo com duas instituições sociais da zona e com a entidade gestora do centro, que tem como objectivos a inserção desta mesma população no mercado de trabalho específico daquele centro comercial

21º

O centro comercial, em zona de restauração, lojas, entre outros espaços, vai criar aproximadamente 4.000 postos de trabalho directos

22º

O centro comercial, irá potenciar um desenvolvimento do sistema rodo-ferroviário; o Metropolitano de Lisboa já tem um projecto de expansão da sua rede até à zona de Alcântara, que terá entrada directa no centro comercial, zona esta que já tem uma saída de comboios da CP e que se encontra numa zona de fácil acesso rodoviário.

Irão ser criados igualmente novos lugares de estacionamento na zona, com a construção de um parque subterrâneo com 4 pisos abaixo do solo, com capacidade para cerca de 600 viaturas, o que se revela da maior importância já que a zona é bastante problemática neste campo, sendo bastante complicado e uma luta diária dos cidadãos encontrarem lugar para poder estacionar a sua viatura

23º

Tal como refere o art. 16º, n.º3 da Lei 48/98 de 11 de Agosto, a coordenação e programação do PDM determina o dever dos particulares adequarem as suas pretensões às metas e prioridades nele estabelecidas. Parte-se do princípio que estes instrumentos de gestão territorial têm como grandes metas e prioridades a prossecução constante do interesse público

24º

A instalação dos painéis solares referidos no ponto 7º revela-se de uma enorme utilidade pública, potencializando assim o aproveitamento de energias renováveis que se mostra essencial nos dias que correm. Ao mesmo tempo que terão capacidade para iluminar as zonas do parque de estacionamento, através de um inovador mecanismo de transmissão automática da energia acumulada, irão garantir o abastecimento do centro comercial para um período de uma hora, no caso de existir alguma falha no fornecimento de energia.

25º

É igualmente de referir a instalação de um inovador equipamento desportivo, um verdadeiro pavilhão multiusos, único na região e que terá a possibilidade de albergar o próximo campeonato mundial de patins em linha. Esta modalidade de desporto, tem um reconhecido alcance internacional e irá permitir uma maior projecção a nível mundial da capital de Portugal, Lisboa.

Para além disso, as infra-estruturas vão albergar um ginásio desenvolvido pela empresa de renome internacional “Holmes Spot”, com uma área bruta com máquinas de cerca de 3.000 m2; irá albergar igualmente diversos estúdios para modalidades desportivas, uma zona onde será feita reabilitação muscular, com 3 fisioterapeutas em permanência no local

26º

O projecto contém o devido estudo de impacte ambiental, exigido pelo art.30º da Lei de Bases do Ambiente e com os conteúdos exigidos pela mesma lei no seu art. 31º (junto em anexo)

27º

Deve ser feita a devida ponderação entre o interesse público em causa e os interesses privados que o Sr. António de Lisboa arguiu na p.i.

As vantagens atrás referidas que o interesse público traz com este projecto, parecem-nos deveras superiores aos interesses privados que o Sr. António de Lisboa vem arguir.

28º

Relativamente ao direito ao ambiente, admitimos que este possa ser considerado como um verdadeiro direito fundamental, e consequentemente sujeito aos regimes dos direitos, liberdades e garantias. No entanto parece-nos que não pode ser levado a um extremo de “não imutabilidade” do espaço físico para novas construções de novos projectos, e não adaptação às circunstâncias que uma sociedade desenvolvida exige

29º

Foi realizado um Estudo de Impacto Ambiental na área, de acordo com as especificações do art.30º da Lei de Bases do Ambiente (Lei n.º 11 /87 de 7 de Abril), como condição essencial para o licenciamento final das obras e trabalhos

30º

O Estudo de Impacto Ambiental (junto em anexo) dá um parecer favorável à construção da obra comercial, estando o projecto de acordo com as exigências feitas pelo Regulamento do PDM, relativos a Sistemas de corredores integrantes da Estrutura Ecológica Urbana, Zona de Vales e Frente Ribeirinha integrantes no Sistema de Vistas, as condicionantes relativas ao facto de ser uma Zona de Maior Risco Sísmico e o respeito do mesmo pelo Núcleo de interesses históricos – art. 18º, 23º, 26º e 24º, respectivamente, do Regulamento do PDM

31º

Mais, é de salientar quer o disposto no art. 25º da Lei 48/98 de 11 de Agosto, quer o disposto no art. 26º do mesmo diploma.

O art. 25º, n.º1 estabelece a adaptação dos instrumentos de gestão territorial às circunstâncias e evolução das perspectivas económica e social

O art. 26º estabelece a possibilidade de suspensão parcial dos instrumentos de gestão territorial, em casos excepcionais e quando razões de interesse público o justifiquem.

Trata-se aqui de um caso excepcionalíssimo, de construção de um empreendimento comercial, que vai atrair emprego, criar boas condições de acessibilidade, e que vai atrair investimento privado na construção do mesmo.

32º

Não nos parece que estando de um lado o interesse público, com as inúmeras vantagens referidas nos números anteriores, se possa embargar uma obra desta dimensão e cariz com fundamento numa pretensão individualizável por parte de uma só pessoa

33º

Há que fazer a devida ponderação dos interesses em causa. Por um lado, o desenvolvimento das regiões, o aumento da qualidade de vida, um maior acesso a novos equipamentos, a novas estruturas que possibilitam um maior bem-estar à generalidade dos cidadãos; de outro lado, uma pretensão individual de uma só pessoa que sente o seu direito ao ambiente e à qualidade de vida invadido, pela construção de um novo centro comercial

34º

Nesta ponderação de interesses deve-se ter em conta o princípio da proporcionalidade nas suas vertentes de necessidade, adequação e razoabilidade, com a consequente minimização dos danos para os particulares. E é através deste princípio que deve ser feita esta ponderação.

35º

Parece-nos, assim, que pesando os interesses do desenvolvimento sócio-económico e melhoria do bem-estar por um lado, e uma restrição ao direito ao ambiente, segundo os argumentos apresentados na petição inicial pela acusação, por outro, o interesse público pesa mais, devendo, consequentemente o acto de licenciamento ser considerado válido e julgado improcedente o pedido de impugnação do mesmo

Termos em que,

Face ao exposto que se peticiona, deve a presente impugnação ser considerada improcedente, com as legais consequências previstas.

Junta:

· Processo gracioso do acto de licenciamento, de acordo com o art. 84º CPTA

· Procuração forense

· Boletim Municipal de aprovação do acto de licenciamento

· Estudo Urbanístico e de Impacto Ambiental

PROCURAÇÃO FORENSE

Eu, António Alfacinha, Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, e na qualidade de representante máximo do Município, confiro os poderes de representação necessários à Sociedade Abecasis, Morais, Paes de Almeida e associados, para representação da Câmara em juízo, relativamente ao processo n.º 45665/07.

Lisboa, 8 de Dezembro de 2007,

__________________________

(Assinatura)

Os advogados:

Tomás Abecasis

Margarida de Morais

Verónica Paes de Almeida

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