Antes da reforma do Contencioso Administrativo português, a tutela cautelar permaneceu centrada no instituto da suspensão da eficácia de actos administrativos. O novo contencioso, porém, vem superar as insuficiências existentes no plano da tutela cautelar ao dar finalmente cobertura formal à adopção de todo o tipo de providências cautelares, ou seja, a passar a contencioso de plena jurisdição nesta matéria. O legislador vem dar cumprimento ao disposto no art. 268º, nº 4 da CRP e consagra um princípio de tutela efectiva em matéria cautelar.
Como refere o artigo 112º, nº 2, as providências cautelares a adoptar podem designadamente consistir na suspensão da eficácia de actos administrativos ou de normas regulamentares, na admissão provisória em concursos e exames, na atribuição provisória da disponibilidade de um bem ou da autorização para iniciar ou prosseguir uma actividade ou adoptar uma conduta, na regulamentação provisória de uma situação ou na intimação da Administração ou de particulares à adopção ou abstenção de condutas. Contudo, este artigo apenas contém um elenco meramente exemplificativo das providências cautelares que passaram a poder ser adoptadas, supletivamente aplicamos as providências cautelares previstas no CPC.
As providências cautelares caracterizam-se fundamentalmente pelos traços da instrumentalidade, na medida em que o processo cautelar só pode ser desencadeado por quem tenha legitimidade para intentar um processo principal e se definir por referência a esse processo principal em ordem a assegurar a utilidade da sentença que nele virá a ser proferida (art. 112º, nº1), e da provisoriedade, que consiste na possibilidade de o tribunal revogar, alterar ou substituir, na pendência do processo principal, a sua decisão de adoptar ou recusar a adopção de providencias cautelares se tiver ocorrido uma alteração relevante das circunstâncias inicialmente existentes, e no próprio carácter efémero deste meio processual que caduca com a sentença. Além disso, traço característico das providências cautelares é também o da sumariedade, pois o tribunal deve proceder a meras apreciações perfunctórias, baseadas num juízo sumário sobre os factos a apreciar, evitando antecipar juízos definitivos que, em princípio, só devem ter lugar no processo principal.
Há dois tipos de providências cautelares em contencioso administrativo:
- as conservatórias, nas quais o interessado pretende manter ou conservar um direito em perigo, procurando evitar vir a ser prejudicado por medidas que a administração venha a adoptar;
- as antecipatórias, onde o interessado procura a adopção de medidas por parte da administração que podem ou não envolver actos jurídicos.
Nas providências cautelares conservatórias, se tiver sido emitido um acto jurídico-administrativo com conteúdo positivo, o art. 112º nº 2 alínea a) permite a resolução do problema com a suspensão da eficácia do acto, tendo a ajuda dos art. 128º e 129º CPTA. As demais providências cautelares conservatórias, caracterizam-se pela imposição provisória de uma ordem para que a administração se abstenha de realizar determinada actividade.
Nas providências cautelares antecipatórias, existe o objectivo de antecipar a titulo provisório um resultado favorável pretendido com o pedido principal, art. 112º nº 2 alínea c), d), e) e f).
Pressupostos para a concessão das providências cautelares são, nos termos do art. 120º, os critérios do periculum in mora e do fumus boni iuris. O primeiro, não pode deixar de ser pressuposto da adopção de toda e qualquer providência cautelar, pois só se poderá afirmar que uma providência visa acautelar a utilidade de uma sentença se houver o risco da inutilidade dessa sentença se a providência não for adoptada. Daí a essencialidade do periculum in mora, consubstanciado no risco da infrutuosidade ou do retardamento da tutela que poderá resultar na mora do processo. Quanto ao segundo, consiste na possibilidade de o requerente vir a ter êxito no processo principal (ter razão quanto ao fundo da causa). A aparência de bom direito é um importante factor de racionalidade enquanto elementar exigência de justiça, que se impõe no interesse de todos os envolvidos no processo. Ninguém deve ficar à mercê do abuso da tutela cautelar por parte de quem faça valer pretensões manifestamente infundadas. Por regra, a atribuição de uma providência cautelar passa, assim, a depender da avaliação, por parte do juiz, sobre, por um lado, a existência do risco da constituição de uma situação de facto irreversível ou da produção de prejuízos de difícil reparação para o requerente e, por outro lado, o grau de viabilidade da pretensão deduzida ou a deduzir no processo principal, tal como ele resulta de uma apreciação perfunctória sobre o mérito da causa.
Além destes dois pressupostos, à luz do princípio da proporcionalidade, o tribunal tem de proceder à ponderação em conjunto dos vários interesses, públicos e privados, em presença para avaliar se os danos que resultariam da concessão da providência não seriam superiores àqueles que poderiam resultar da sua recusa (art. 120º, nº2).
Actualmente, interpor providências cautelares parece estar a tornar-se moda. Com a reforma de 2004, parece que se passou do oito para o oitenta e as providências cautelares estão a invadir os tribunais administrativos portugueses. O presidente do STA afirma que é preciso resistir, com determinação, ao impulso de trivialização deste tipo de processos. Há quem diga que há o perigo de se politizar a justiça, contudo alguns nomes importantes do nosso contencioso administrativo, nomeadamente o nosso Professor Vasco Pereira da Silva, refuta essa possibilidade pois os juízes só apreciam se a decisão é ou não legal. O controlo de mérito não existe em Portugal.
Contudo, e, apesar de todas estas criticas que possam agora vir a surgir, não há duvida que a reforma mostrou-se essencial no âmbito da tutela cautelar e que os particulares ficaram agora com um acesso facilitado a uma “arma” capaz de paralisar a Administração Pública.
Realizado por Diana Ferreira, Soraia Mateus e Raquel Ferreira
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